A terapia é considerada como sendo um espaço prazeroso e de conforto, porém a terapia é definitivamente outra coisa. É um espaço onde se enfrentam demónios, se mergulha num ínfimo desespero neurótico, se explora padrões de resposta e se desafia o próprio sistema interno de crenças. A terapia é um espaço onde aprendemos a sentirmo-nos desconfortáveis connosco, para que sejamos capazes, em ultima instância, de nos sentirmos mais confortáveis com quem somos e qual o nosso papel no mundo.
“Não Me Sinto Melhor”
Richard Alpert mais reconhecido por Ram Dass, professor catedrático de Harvard e psicólogo clínico expressou: “depois de 40 anos de psicoterapia e meditação não me sinto menos neurótico que antes, simplesmente passei a convidar as neuroses para um chá”. Por mais bizarro que esta ideia pareça, ela encaixa na perfeição para aqueles que se encontram “a meio do processo” e isso expressa exatamente o que é sentido quando se realiza uma autoanalise. “Não me sinto melhor”. Aquilo que acontece é na verdade diminuir a carga da luta, reformula-la e usar a aprendizagem para a tornar menos destrutiva e, em alguns casos, mais produtiva – falamos sobretudo de escolhas.
Antes que tal aconteça, porém, é preciso chegar até ao mais profundo nível de reconhecimento e enfrentar e desafiar os nosso próprios “demónios” internos na profundeza do ser. Depois é necessário desconstruir os padrões repetitivos de pensamento e comportamento que originam e obrigam a um desgaste nas relações, carreia profissional, interação familiar e obviamente, tantos outros aspetos da vida como as questões financeiras ao cuidado próprio. Não há nada para prever sobre o que nos leva a tomar esta escolha. Os motivos que nos levam a levantar questões, pode estar relacionada com o emprego, com o término de uma relação ou simplesmente com questões existenciais sobre a forma como vivemos a nossa vida. Seja qual for o motivo, o que sabemos é sobretudo que a autoanalise é tão poderosa que quanto mais a adiarmos, menos tempo temos, o que pode tornar as coisas ainda mais complexas.
Acender Uma Luz na Escuridão
Todos nós temos uma carapaça. Às vezes a vida abre uma porta que se tem mantido fechada e isso faz-nos sentir capazes de ultrapassar dúvidas e encontrar soluções para os problemas. Por vezes essa luta, também se transforma numa descrença devastadora sobre as nossas capacidades de ultrapassar e seguir em frente. Esta situação deixa-nos apenas com uma possível escolha entre duas – ficar parado ou lutar, ou seja, podemos optar por aceitar a escuridão e viver nela, ou então explorar as possibilidades ainda que não saibamos muito bem que passos dar. É sempre uma opção, no entanto, nós escolhemos a segunda opção. Ao fazer esta escolha de virar o olhar para dentro e espreitar, começamos por em primeiro lugar, reconhecer e abraçar as vulnerabilidades e imperfeições. É nesta altura que as coisas começam a ter um verdadeiro interesse e significado, mas também se transformam numa confusão. É nesta fase que podemos dizer que o verdadeiro trabalho começa.
Tornar-se Testemunha
Uma das importantes ferramentas do processo é desenvolver algo chamado de “tomada de consciência”. Este é considerado um estado natural de presença – as palavras operacionalizadas ganham forma e objetivamente, passamos a observar com transparência o pensamento e as ações. Este não é um estado de desafeto ou ausência emocional, muito pelo contrário. A tomada de consciência é um olhar descontraído de relaxamento sobre o que está a acontecer no presente connosco – alterações no corpo, nos pensamentos e nas emoções. É o momento em que nos colocamos frente a frente com o desconforto e nos propomos a ver o que realmente acontece, tornando-se numa janela de oportunidade – a forma como nos vemos no mundo. Essa janela transforma-se num campo de visão para os vários trilhos possíveis a seguir e essa revelação, de uma nova perspetiva sobre nós no mundo, traz-nos uma outra descoberta… não estamos mais no mesmo sítio.
A ligação entre os desafios e a transformação, a luz que vemos entre a montanha, transforma-se numa oportunidade de descobrir a verdadeira natureza, o verdadeiro Eu.
Abraçar a Mudança
A revelação de um Eu autêntico significa por si só mudança e a mudança pode ser dura. A energia provocada por esta ação é normalmente tão forte, tão intensa, que somos totalmente presenciados com uma oportunidade de integração de nós próprios. Essa transformação dá-nos uma sensação de renascimento e construção de um novo Eu.
Durante essa longa jornada existem muitos tombos e deslizes. Para aqueles que são bravos e conseguem no fundo do seu ser ganhar coragem para enfrentar essa jornada, são capazes de abraçar a nova oportunidade, ganhando sobretudo uma nova vida e uma nova forma de estar no mundo.
Retirado e adaptado de When Therapy Makes Things Worse – Getting Comfortable With our Discomfort